sábado, 7 de agosto de 2010

Manual para viver sem o jornalismo esportivo

Domingo, 9 de maio de 2010. Sentada numa cadeira do Centreventos, ouço o Jorge Ben passar o som antes de fazer seu show em Joinville. Entre conversas, piadas e cigarros com um amigo, ele vira pra mim e fala:
- Terça-feira sai a convocação do Dunga, né?
Respondo que sim e comento o burburinho do momento: Neymar e Ganso vão, ou não? Ele brinca dizendo que na verdade também está esperando ser chamado pelo Dunga. Diz, com um sorriso, que o técnico já viu suas jogadas e conhece sua habilidade com a bola.

- Que Neymar, que nada, quem vai sou eu! – brinca ele.
Terça-feira, 11 de maio de 2010, de manhã. Abro o twitter da empresa em que trabalho para fazer algum contato com o público. Não dá muito certo. Só se fala na convocação. E todos só querem ler o que se está falando sobre o assunto.

Terça-feira, 11 de maio de 2010, à tarde. A lista de Dunga já saiu e nem vi. Mas me convenço de que saberei em poucas horas a exata escalação sem ler sequer uma notícia. Saio do meu quarto e minha mãe é a primeira a me dar uma informação: o Adriano não vai.

Terça-feira, 11 de maio de 2010, fim de tarde. Entro na van que me leva até a faculdade e imediatamente recebo mais informações sobre as escolhas de Dunga. Não vai Neymar, Ganso e Ronaldinho Gaúcho. Kléberson, que é reserva do Flamengo, é um dos escolhidos. O Ramires, menino que jogou no JEC – o time da cidade, também disputará o mundial.

Terça-feira, 11 de maio de 2010, à noite. Coloco o fone de ouvido, como de costume, ao entrar na BR para fazer o caminho de volta pra casa. Mas hoje o MP4 não serve. O som das pessoas falando ultrapassa o volume das minhas músicas. O assunto em pauta é o óbvio. Mais uma descoberta: Grafite é quem está no lugar de Adriano. Quando chego em casa, confiro no telejornal a escalação já formada em minha cabeça.
Ao fim de um dia inteiro ouvindo as pessoas falarem sobre a convocação de Dunga para a Copa, descobri que não preciso ler jornal para saber dos acontecimentos esportivos. Afinal, tá na boca de todos. Todo mundo sabe e opina sobre o assunto. Cada um tem seu ponto de vista. E, o melhor de tudo, há argumentos.

Mas, onde estão esses argumentos nas discussões sobre política, eu não sei. Ou melhor, cadê as discussões políticas?
- Esse não está em forma, o outro não deveria ser escolhido, aquele lá nunca fez nada pelo Brasil.
É claro que essas frases que ouvimos poderiam ser de indignação sobre a política brasileira. Sobre ‘a forma’ dos políticos em fazer bons projetos. Ou o erro da escolha. Ou, então, o reconhecimento de que ‘aquele lá’ nada faz por nosso país. Mas as opiniões são apenas sobre os jogadores que o técnico da seleção escolheu para disputar um campeonato de futebol.
Analisando a situação contemporânea, percebo que aprendi mais uma coisa. No Brasil, futebol é uma equação simples. Um técnico, algumas palavras e 23 nomes estranhos (Kléberson, Elano, Grafite...) resultam em alguns milhões de indignados. Na política, a conta é outra: um senador, nenhuma palavra e alguns milhões roubados. O resultado? Apenas uns 23 estranhos indignados.