domingo, 21 de novembro de 2010

haikai

A arte da escrita
Sento-me cheia de dedos
Para escrever apenas um haikai

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Programa sobre a Língua Portuguesa estreia em outubro na Rádio Udesc


Estreia no dia 4 de outubro o programa “Língua Viva” na Rádio Udesc FM Joinville (91.9). O programa terá, diariamente, dicas de como falar corretamente, curiosidades sobre a língua, análise de músicas, poemas recitados, etc. Serão 5 minutos diários, de segunda a sexta-feira em dois horários: 9h15 e 15h15.
O programa, produzido e apresentado por Talita Rodrigues, é um dos projetos apoiados pelo Edital de Apoio à Cultura do Sistema de Desenvolvimento pela Cultura (Simdec) de Joinville. O projeto previu 50 programetes sobre a Língua Portuguesa para serem veiculados na Rádio Udesc de Joinville. As duas outras emissoras educativas da Udesc, de Florianópolis e Lages, também irão veicular os programas.

O Quê? Programa Língua Viva
Quando? A partir de 04/10, de segunda a sexta-feira, 9h15 e 15h15
Onde? Rádio Udesc FM Joinville 91.9
Mais informações: (47) 3423 0900 ou 8804 8933 - Talita

sábado, 7 de agosto de 2010

Manual para viver sem o jornalismo esportivo

Domingo, 9 de maio de 2010. Sentada numa cadeira do Centreventos, ouço o Jorge Ben passar o som antes de fazer seu show em Joinville. Entre conversas, piadas e cigarros com um amigo, ele vira pra mim e fala:
- Terça-feira sai a convocação do Dunga, né?
Respondo que sim e comento o burburinho do momento: Neymar e Ganso vão, ou não? Ele brinca dizendo que na verdade também está esperando ser chamado pelo Dunga. Diz, com um sorriso, que o técnico já viu suas jogadas e conhece sua habilidade com a bola.

- Que Neymar, que nada, quem vai sou eu! – brinca ele.
Terça-feira, 11 de maio de 2010, de manhã. Abro o twitter da empresa em que trabalho para fazer algum contato com o público. Não dá muito certo. Só se fala na convocação. E todos só querem ler o que se está falando sobre o assunto.

Terça-feira, 11 de maio de 2010, à tarde. A lista de Dunga já saiu e nem vi. Mas me convenço de que saberei em poucas horas a exata escalação sem ler sequer uma notícia. Saio do meu quarto e minha mãe é a primeira a me dar uma informação: o Adriano não vai.

Terça-feira, 11 de maio de 2010, fim de tarde. Entro na van que me leva até a faculdade e imediatamente recebo mais informações sobre as escolhas de Dunga. Não vai Neymar, Ganso e Ronaldinho Gaúcho. Kléberson, que é reserva do Flamengo, é um dos escolhidos. O Ramires, menino que jogou no JEC – o time da cidade, também disputará o mundial.

Terça-feira, 11 de maio de 2010, à noite. Coloco o fone de ouvido, como de costume, ao entrar na BR para fazer o caminho de volta pra casa. Mas hoje o MP4 não serve. O som das pessoas falando ultrapassa o volume das minhas músicas. O assunto em pauta é o óbvio. Mais uma descoberta: Grafite é quem está no lugar de Adriano. Quando chego em casa, confiro no telejornal a escalação já formada em minha cabeça.
Ao fim de um dia inteiro ouvindo as pessoas falarem sobre a convocação de Dunga para a Copa, descobri que não preciso ler jornal para saber dos acontecimentos esportivos. Afinal, tá na boca de todos. Todo mundo sabe e opina sobre o assunto. Cada um tem seu ponto de vista. E, o melhor de tudo, há argumentos.

Mas, onde estão esses argumentos nas discussões sobre política, eu não sei. Ou melhor, cadê as discussões políticas?
- Esse não está em forma, o outro não deveria ser escolhido, aquele lá nunca fez nada pelo Brasil.
É claro que essas frases que ouvimos poderiam ser de indignação sobre a política brasileira. Sobre ‘a forma’ dos políticos em fazer bons projetos. Ou o erro da escolha. Ou, então, o reconhecimento de que ‘aquele lá’ nada faz por nosso país. Mas as opiniões são apenas sobre os jogadores que o técnico da seleção escolheu para disputar um campeonato de futebol.
Analisando a situação contemporânea, percebo que aprendi mais uma coisa. No Brasil, futebol é uma equação simples. Um técnico, algumas palavras e 23 nomes estranhos (Kléberson, Elano, Grafite...) resultam em alguns milhões de indignados. Na política, a conta é outra: um senador, nenhuma palavra e alguns milhões roubados. O resultado? Apenas uns 23 estranhos indignados.

sábado, 27 de março de 2010

Histórias de Cor[ação]


Carol e suas mãos concentradas
Todo mundo tem uma história pra contar. Carol tem várias e as guarda dentro de uma caixinha amarela de madeira. Agora são 10h39 da manhã e as histórias ainda não acordaram, diz ela. Mas, com a ajuda de algumas crianças, elas logo sairão da caixa para povoar o lúdico universo infantil.

Alguém aí sabe em que parte do corpo fica a concentração? – começa ela depois de explicar que esse é o item que se precisa para ouvir uma história. Os olhinhos, as vezes atentos, as vezes dispersos, estão parados à frente de Carolina. Mas logo se movem junto aos corpos procurando o primeiro menino que responde.
- É na cabeça!
Todos os outros repetem: “Cabeça!”, “Fica na cabeça”, “Acho que é na cabeça!”

Não, não. Segundo a contadora, a concentração fica em uma parte do corpo que não é na cabeça, nem na barriga, nem nos joelhos. Fica nas mãos.
- Olha o quanto de concentração tem nas mãos de vocês! Tão vendo? Então esfreguem uma na outra. Agora coloquem as mãos nas orelhas. Pra ouvir uma história a gente precisa de concentração pra escutar, não é?

Todas as crianças seguem sorridentes as orientações de Carol. Colocam suas mãos nas orelhas, para ouvir a história melhor; colocam as mãos nos olhos, para prestar atenção na contadora; colocam as mãos na cabeça, para entender bem o que vai ser contado. Aos que estão sentados, Carol pede para que coloquem sua concentração no bumbum também, para que permaneçam sentados. Os que estão em pé podem colocar as mãos concentradas nos pés.

Pronto! Está feito o primeiro contato. É com o uso da interação que a contadora de histórias Carolina Spieker consegue os primeiros minutos da preciosa atenção de seus expectadores, as crianças. Carol parte, então, para o desempenho de sua função. Depois de “despertar as histórias” batendo na caixinha com a ajuda de algumas crianças, ela pega um dos papeizinhos que lá estão e começa a história do menino João Jiló.

Paralelos a isso estão cadernos, mochilas com cinderelas e super-heróis, canetas de todos os tipos, e livros. Tudo muito colorido. O cenário no qual Carol e suas crianças fazem parte, neste momento, é uma livraria. Lugar agradável, bonito e confortável, mas cheio de fáceis possibilidades para desviar a atenção de uma criança.

Ali estão também os pais. Todos aparentemente jovens, com seus 30 e poucos anos. Alguns deixam seus filhos assistindo a performance de Carol e passeiam pela livraria olhando os títulos. É o caso do engenheiro Abel Serrão, que entre um livro e outro, observa sua filha Isabela de longe para se certificar de que tudo está bem. Faz isso porque, para ele, esse é um momento somente das crianças.

Os outros pais e mães preferem estar entre suas crias. Mas, como não esfregaram suas mãos cheias de concentração nos olhos, orelhas, cabeças e bumbuns, como fizeram as crianças, não param. Não olham, não escutam, não entendem e não ficam no mesmo lugar por muito tempo. Alguns chegam a conversar entre si, bem atrás do tapume onde estão Carol e as crianças.

A difícil tarefa que Carol tem de captar a atenção de todos os pequenos se torna ainda mais complicada com o colorido cenário e a presença dos pais desatentos e agitados. Apesar disso, a contadora não se mostra incomodada um só minuto. Conta a primeira história, a segunda sorteada da caixinha, faz perguntas às crianças, canta músicas. Depois conta a terceira e a quarta história. Tudo com muita tranqüilidade e um tom sereno de voz.

O baú de Juliana e Túlia
É comum que todo contador tenha uma caixa cheia de histórias pra contar. Essa caixa pode estar simplesmente na imaginação ou pode ser real e amarela como a de Carol. Mas Túlia e Juliana usam um baú. Onze crianças, entre 3 e 6 anos, estão sentadas em mini-cadeiras e observam atentas os diferentes objetos que saem daquela grande caixa.

Um avental, um boné, pedaços de tecido e o lenço que transforma Túlia em uma engraçada velha são alguns objetos que as duas contadoras tiram de seu baú. Estes adereços as transformam, em poucos segundos, em mãe, menino, velha e qualquer outro personagem de uma história infantil. A contação de Túlia e Juliana é cênica.

Em meio à pequena platéia está Rafael. O menino, de cabelos pretos em forma de “tigela” e rosto arredondado, não perde a oportunidade de interagir. Foi o primeiro a responder à Carol, no dia anterior, onde fica a concentração. Hoje responde também à Juliana e Túlia, as vezes com palavras, as vezes com risadas.
- Macaco! – diz ele interrompendo Juliana enquanto ela conta que o menino João Bobo deu banana ao papagaio. A contadora sorri explicando que os papagaios também comem banana, assim como os macacos.

A performance de Juliana Apple e Túlia Januário consegue prender a atenção de Rafael, das outras crianças e dos pais que hoje estão mais calmos, em menor quantidade e num lugar com menos opções de distração. As crianças saem empolgadas, com as histórias que aprenderam, e ansiosas para contá-las aos amiguinhos e familiares. Apesar disso, não querem ir para casa. Puxam de forma insistente seus pais até a estante de livros mais próxima.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Lar, verde, lar



O ministro do Meio Ambiente Carlos Minc declarou recentemente que a sustentabilidade é como a camiseta do Che Guevara: todo mundo usa ou é a favor, mas ninguém lembra o que significa. Pois é! A sustentabilidade já faz parte da moda contemporânea. O termo começou a ser discutido na década de 1980, mas é agora, no século XXI, que a palavra chegou à boca do povo. Apesar de ter grande espaço na mídia mundial, pouco se sabe da amplitude do tema. Quem pensa que sustentabilidade é assunto apenas para o marketing empresarial vai se surpreender quando encontrar com ela na própria casa.


Adaptar moradias ao entorno não é atitude do homem das cavernas. Faz parte da proposta dos dias de hoje. A construção e a arquitetura sustentável são novas alternativas para fazer as pessoas ajudarem a preservar o meio ambiente, além de economizar e melhorar a própria qualidade de vida. Tudo isso dentro de casa.


Sustentabilidade na área da arquitetura é muito confundida com rusticidade, diz o arquiteto Mateus Szomorovszky. Muitas pessoas procuram um arquiteto em busca da chamada “casa sustentável” ou “casa ecológica”, mas têm em mente um ambiente rústico para morar. Se essa confusão existe, as pessoas devem saber, primeiramente, o que é uma moradia sustentável.


A tentativa de transformar o edifício em parte do habitat vivo, encontrando nele soluções aos problemas ambientais como na utilização eficiente dos recursos naturais e na reutilização de outros materiais. Esta é a missão da construção e da arquitetura sustentável.


Reaproveitar a água da lavanderia e da chuva, ter janelas que privilegiem a iluminação natural, utilizar resíduos como elementos de construção e decoração. São muitas as possibilidades que uma casa pode ter para ser sustentável. Segundo o arquiteto Mateus Szomorovszky o mercado apresenta cada vez mais novidades em materiais para casas sustentáveis, mas eles devem ser usados de acordo com as necessidades de cada pessoa, região e ambiente.


O projeto de uma casa ou prédio sustentável começa com a análise do terreno e sua localização. O arquiteto identifica as possibilidades de construção no espaço que já existe procurando não modificar elementos naturais e aproveitar as características do local como, por exemplo, o clima, o vento, a luz solar e a sombra. Tudo de acordo com as necessidades do morador.


A segunda etapa do projeto é escolher as práticas sustentáveis que a pessoa quer trazer para dentro de casa. A utilização de placas solares como fonte de energia, a captação da água da chuva para as descargas, a escolha de pisos e azulejos reciclados e etc. Os sistemas e materiais usados nessas construções variam de acordo com cada projeto e necessidade. Isso porque o cumprimento de uma obra sustentável pode pesar no bolso.


Segundo o arquiteto Mateus Szomorovszky, a execução de um projeto sustentável custa em torno de 15 a 20% mais caro. Isso porque, em geral, os materiais custam mais e a mão-de-obra tem de ser especializada. Porém, é evidente que há como benefício uma economia em longo prazo. Já que, como diz o arquiteto Mateus, “a sustentabilidade tem que ser prazerosa, gerar custo/beneficio pra pessoa”.


Ser economicamente viável é o primeiro pilar da sustentabilidade. Os outros são: ecologicamente correto e socialmente aceito. Em resumo, um projeto sustentável tem de fazer bem para o meio ambiente, para a sociedade e também para o bolso das pessoas envolvidas. É aí que entra tantos benefícios que a sustentabilidade pode trazer, seja ela fora ou dentro de casa.


O engenheiro agrônomo e ecologista Gert Fischer tem uma casa ecológica e diz que é gratificante o sucesso de suas práticas sustentáveis onde mora. Isso porque Gert foi além da preocupação com a própria casa e ensinou seus vizinhos a agirem com sustentabilidade. De acordo com Gert, não devemos pensar apenas nas vantagens que temos em praticar a sustentabilidade e cuidar do meio ambiente. “Temos que perguntar quais os serviços ambientais que prestamos e usufruímos e o que isto nos gratifica ou penaliza” – explica ele.


Para os que desejam trazer a sustentabilidade pra dentro de casa sem ter muitos gastos é só seguir o exemplo do ecologista. Gert usa a sustentabilidade em sua casa de forma criativa. Ele construiu uma unidade de coleta da água da chuva com materiais reciclados e mais baratos. Além disso, para proteger a casa do calor do verão, ele revestiu duas paredes de madeira com cercas vivas verdes.


Gert também dá exemplos de aliar a construção sustentável ao bom senso. Ou seja, não apenas com adaptações nas casas, mas com práticas sustentáveis do morador. Ele utiliza o lixo orgânico como adubo para as plantas; separa o lixo reciclável para doar à uma família que obtém seu sustento com isso e alimenta pássaros com restos de comida.


Para o arquiteto Mateus Szomorovszky, este bom senso é indispensável na sustentabilidade. Ele diz que não adianta, por exemplo, uma pessoa ter uma casa sustentável no interior, se ela é obrigada a usar o carro todos os dias para trabalhar na área urbana. Isso porque a sustentabilidade é tão ampla que vai além de uma casa ecologicamente correta.

As ecovilas

Praticar a sustentabilidade vivendo harmonicamente em grupo é a proposta das ecovilas. A idéia de criar comunidades desse tipo surgiu no começo da década de 1990, na Dinamarca. Hoje, quase 20 anos depois, esse conceito se expande pelo mundo todo.


Em Garuva, região norte de Santa Catarina, há uma pequena ecovila. A comunidade fica nos pés da montanha Monte Crista e tem 9 casas com 15 moradores. Fundada à cerca de 7 anos, ela ainda está “migrando do urbano para o alternativo”, diz uma das integrantes do projeto Tereza Geiser.


A Comunidade Monte Crista ainda usa energia elétrica, mas já está em processo de transição para a energia solar. Quanto a captação da água da chuva, nenhum projeto foi implantado ainda já que a água dos morros é abundante, mas a idéia está sendo discutida.


Contudo, há muitas práticas sustentáveis nas moradias. O esgoto é tratado através de um sistema de zona de raízes, que separa o sólido do líquido para não poluir. Os lixos de banheiros são empacotados em jornais com o objetivo de não usar sacolas plásticas. Há a utilização de lixo orgânico nas plantações e o lixo reciclável é também separado.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O Estranho Velhinho



Dezembro. Clima natalino, guirlandas, ruas cheias de luzes e, claro, shoppings lotados. Aposto que muitas pessoas já passaram, nesse mês, por algum desses aglomerados de lojas. Se passaram, não há duvida de que já se depararam com uma figura velha de barbas brancas que habita os shoppings nessa época do ano. Sim! O Papai Noel.
Será que alguém já parou para pensar o que esse “velhinho do shopping” significa para nós? O que ele tem a ver com o Natal? O que ele tem a ver com a nossa cultura ou até mesmo o que ele tem a ver com a gente? Pois bem! Vamos ver.
Moramos num país tropical onde a maioria dos lugares é quente quase o ano todo. O calor faz as pessoas usarem roupas curtas e leves, principalmente no verão. Verão é a estação no qual acontece o Natal no Brasil. Papai Noel, mesmo aparecendo por aqui só no Natal, sempre está vestindo roupas compridas e pesadas. Além disso, usa botas e luvas.
Tem também a neve. Papai Noel e o Natal sempre vêm acompanhados de neve. Nos pinheirinhos, nas decorações de rua, nos bonecos de neve feitos de qualquer outra coisa, menos de neve. No Brasil, salvo raríssimas exceções de lugares e épocas, não cai neve. Grande maioria dos brasileiros nunca viu neve na vida.
No Brasil também as pessoas têm muitos meios de transporte. Carro, moto, ônibus, bicicleta, avião. Mesmo assim, Papai Noel vem de trenó. Trenó? Alguém aí já andou de trenó? Acho que não. E de trenó puxado por renas? Acho que também não. Por falar nisso, alguém aí já viu uma rena?
Papai Noel também tem ajudantes. Não são homens assalariados que trabalham meses inteiros para, no fim, receberem uma quantia em dinheiro que servirá para a troca por itens que necessita. Os ajudantes do Papai Noel são duendes. Bem, se você nunca viu uma rena, acho difícil ter visto um duende. No Brasil e, pelo que se sabe apesar das controvérsias, no resto do mundo também não existem duendes.
Ele não é brasileiro. Essa é a primeira conclusão que podemos chegar ao observar de forma rápida e superficial o Papai Noel. Ele não se parece com a gente, não usa roupas como as nossas, não anda com o mesmo transporte que nós. Mas, mesmo assim, todo ano ele está presente no nosso natal. Faz parte da nossa cultura mesmo não tendo sido criado por nós.
Tantas diferenças e ainda assim a figura do Papai Noel emociona, traz comoção e esperança. Os motivos certamente não são os de identificação cultural. São de representação de símbolos bem mais brasileiros: solidariedade e esperança. O velhinho pode ser um pouco estranho, mas todos os anos nós fechamos os olhos para as suas estranhezas e simplesmente acreditamos.
Não é hora de pensarmos em simbolismos, é hora de nos encher de esperança. E é isso que o Natal e o Papai Noel representam para nós. È a esperança de um mundo um pouquinho melhor. Um mundo em que as diferenças são aceitas. Um mundo em que todos aceitam o outro. Mesmo que esse outro venha do Pólo Norte e seja estranhamente parecido com a gente.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Alfaiate da Multidão



Fita métrica no pescoço, agulha e linha na mão. É assim que Daniel da Silveira passou 64 anos de sua vida. Conhecido como “o alfaiate da multidão”, Daniel é o mais antigo profissional de alta costura para homens em Joinville. Hoje, prestes a completar 79 anos, continua exercendo seu ofício que já não é mais tão requisitado quanto foi anos atrás.
No dia em que completou 14 anos de idade, o pai de Daniel disse que já estava na hora de lhe arrumar um trabalho. A mecânica não poderia ser, já que Daniel não apresentava porte físico para isso. Disse então, que a alfaiataria seria uma boa escolha. No dia seguinte, Daniel já saiu falando para todos os seus amigos: “eu vou ser alfaiate”.

Trabalhou voluntariamente em uma alfaiataria, durante três anos, para aprender o ofício. Fez seu primeiro terno para um amigo que lhe pediu. E, no dia 6 de setembro de 1954, sem saber que este era o dia do alfaiate, abriu sua própria loja no centro de Joinville. Lá a placa anunciava o slogan inventado por ele mesmo: Daniel, o alfaiate da multidão.

Com a ajuda de propagandas de rádio criadas pelo próprio Daniel, a alfaiataria cresceu e se tornou competitiva no mercado de moda masculina. Ele conta que o tempo médio para fazer um traje completo é de dois dias, mas na época, com o auxilio de outros costureiros, sua alfaiataria chegava a produzir nove trajes por dia.

Com certa nostalgia, Daniel relembra os tempos de elegância da cidade. “Antigamente, as pessoas faziam um terno e compravam um chapéu. Hoje, chapéu é pra quem tem cabeça!” – brinca ele. A elegância é a principal admiração do alfaiate que lamenta não haver mais o hábito de se usar terno. “Eu mantenho até a gravata, honrando a minha profissão”.

Daniel também relembra as épocas em que muito trabalhava. Como no Natal quando, antigamente, as pessoas faziam ternos especiais. Hoje, ele diz que nem nos casamentos se faz questão de um bom terno: “se o padre deixasse, casariam de bermuda e chinelo”.

O Chile foi um dos lugares que mais o encantou pela distinção dos trajes. Em uma de suas viagens a convenções, Daniel observou os ternos lá usados até por crianças, como uniforme de escola. E mesmo trabalhando para homens, não deixou de perceber que naquele país até as mulheres se vestiam bem, elegantes, “só usavam saia”.

Hoje, a preocupação com a elegância já não é mais o principal motivo para a procura de um alfaiate. Daniel diz que a maioria de seus fregueses são pessoas que não conseguem encontrar uma roupa adequada em lojas. Ou são muito altos, ou mais gordos do que o normal, ou até os baixinhos que têm braços e pernas curtas e o terno vai sempre além de seu tamanho.

A concorrência entre lojas de roupas produzidas em série e alfaiatarias já existia nos gloriosos anos de Daniel. Mas ele conta que aos poucos, os alfaiates foram perdendo espaço porque as pessoas que estavam dentro dos padrões de medidas encontravam facilmente roupas adequadas e mais acessíveis. Isso porque, como a alfaiataria é um tipo de artesanato personalizado, o trabalho sempre foi um pouco mais caro.

A briga entre alfaiates e lojas era tão forte que Daniel chegou até a responder em um anuncio de rádio. Uma loja havia colocado no ar a propaganda “Não compre roupa feita, compre roupa bem feita”. E Daniel, com sua perspicaz criatividade para frases bonitas, colocou uma propaganda no rádio que dizia: “Não compre roupa feita, roupa feita por mais bem feita, nunca é perfeita!”.

Criar slogans e anúncios é um dos talentos de Daniel. Anunciou em várias emissoras de rádio da cidade, durante muitos anos, e sempre escreveu os textos. Em um deles, inventou um personagem que não tinha o que usar. “Adão não se vestia porque Daniel não existia”. A frase virou marca do alfaiate e é lembrada até hoje por muitos moradores de Joinville.

Mas apesar da habilidade com as palavras, Daniel diz que a alfaiataria é seu verdadeiro dom. “A minha profissão depende de dom, tem que ter vocação”. E foi por isso que Daniel aprendeu seu ofício com facilidade e entusiasmo, mas, mesmo tendo habilidade suficiente, nunca deixou de estudar.

Daniel participou de muitos encontros e congressos de alfaiataria no Brasil inteiro e até em outros países. Fez cursos no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre. Participou de eventos em São Paulo, Montevidéu no Uruguai e na encantadora Santiago, no Chile. Em todos os lugares que passou, fez amigos e aperfeiçoou sua profissão.

Em uma de suas idas a Santos, conheceu a escola de alfaiate da Febem e trouxe para Joinville a ideia de ensinar alfaiataria aos presos. Infelizmente, o projeto não deu certo, mas outra sugestão foi acatada pelo então prefeito Luiz Henrique, hoje governador: a de criar um curso na rede municipal. Graças a Daniel, o curso foi criado e serviu para prolongar um pouco mais a profissão. O que Daniel lamenta é a quantidade mínima de pessoas que acabaram por se formar antes de o curso acabar por falta de procura.

Assim como o atual governador Luiz Henrique da Silveira, que lhe ajudou nos projetos quando prefeito, muitas outras personalidades foram vestidas pelo alfaiate. O governador Pedro Ivo Campos usou muitos ternos feitos pelas mãos de Daniel. O ex-prefeito de Joinville Marco Tebaldi também recorreu aos seus serviços e tomou posse vestindo um de seus elegantes trajes.

De cabeça erguida, com os olhos distantes e um leve sorriso no rosto, Daniel se enche de orgulho ao contar seus feitos durante tantos anos de trabalho. E, apesar de ser conhecido no Brasil inteiro, o alfaiate da multidão também se sente orgulhoso por sua cidade. “Daniel da Silveira, até morrer, nascido e criado em Joinville, sem vontade de sair” – brinca ele.

Com tantas histórias e lembranças, o alfaiate da multidão permanece junto a seus tecidos na nova loja que hoje é também sua casa. O orgulho pelo seu trabalho e a dedicação são seus companheiros em dias que se distanciam daqueles que o fizeram ficar conhecido em Joinville e no resto do Brasil como Daniel, o alfaiate da multidão.

As propagandas de Daniel

Adão não se vestia
Porque Daniel não existia
Agora se veste, Adão
Tem Daniel, o alfaiate da multidão

Cada roupa tem seu tempo
Cada tempo uma estação
Uma roupa para qualquer tempo
Só no alfaiate da multidão

Não compre roupa feita
Roupa feita por mais bem feita, nunca é perfeita

O símbolo de elegância e perfeição
É Daniel, o alfaiate da multidão