quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Alfaiate da Multidão



Fita métrica no pescoço, agulha e linha na mão. É assim que Daniel da Silveira passou 64 anos de sua vida. Conhecido como “o alfaiate da multidão”, Daniel é o mais antigo profissional de alta costura para homens em Joinville. Hoje, prestes a completar 79 anos, continua exercendo seu ofício que já não é mais tão requisitado quanto foi anos atrás.
No dia em que completou 14 anos de idade, o pai de Daniel disse que já estava na hora de lhe arrumar um trabalho. A mecânica não poderia ser, já que Daniel não apresentava porte físico para isso. Disse então, que a alfaiataria seria uma boa escolha. No dia seguinte, Daniel já saiu falando para todos os seus amigos: “eu vou ser alfaiate”.

Trabalhou voluntariamente em uma alfaiataria, durante três anos, para aprender o ofício. Fez seu primeiro terno para um amigo que lhe pediu. E, no dia 6 de setembro de 1954, sem saber que este era o dia do alfaiate, abriu sua própria loja no centro de Joinville. Lá a placa anunciava o slogan inventado por ele mesmo: Daniel, o alfaiate da multidão.

Com a ajuda de propagandas de rádio criadas pelo próprio Daniel, a alfaiataria cresceu e se tornou competitiva no mercado de moda masculina. Ele conta que o tempo médio para fazer um traje completo é de dois dias, mas na época, com o auxilio de outros costureiros, sua alfaiataria chegava a produzir nove trajes por dia.

Com certa nostalgia, Daniel relembra os tempos de elegância da cidade. “Antigamente, as pessoas faziam um terno e compravam um chapéu. Hoje, chapéu é pra quem tem cabeça!” – brinca ele. A elegância é a principal admiração do alfaiate que lamenta não haver mais o hábito de se usar terno. “Eu mantenho até a gravata, honrando a minha profissão”.

Daniel também relembra as épocas em que muito trabalhava. Como no Natal quando, antigamente, as pessoas faziam ternos especiais. Hoje, ele diz que nem nos casamentos se faz questão de um bom terno: “se o padre deixasse, casariam de bermuda e chinelo”.

O Chile foi um dos lugares que mais o encantou pela distinção dos trajes. Em uma de suas viagens a convenções, Daniel observou os ternos lá usados até por crianças, como uniforme de escola. E mesmo trabalhando para homens, não deixou de perceber que naquele país até as mulheres se vestiam bem, elegantes, “só usavam saia”.

Hoje, a preocupação com a elegância já não é mais o principal motivo para a procura de um alfaiate. Daniel diz que a maioria de seus fregueses são pessoas que não conseguem encontrar uma roupa adequada em lojas. Ou são muito altos, ou mais gordos do que o normal, ou até os baixinhos que têm braços e pernas curtas e o terno vai sempre além de seu tamanho.

A concorrência entre lojas de roupas produzidas em série e alfaiatarias já existia nos gloriosos anos de Daniel. Mas ele conta que aos poucos, os alfaiates foram perdendo espaço porque as pessoas que estavam dentro dos padrões de medidas encontravam facilmente roupas adequadas e mais acessíveis. Isso porque, como a alfaiataria é um tipo de artesanato personalizado, o trabalho sempre foi um pouco mais caro.

A briga entre alfaiates e lojas era tão forte que Daniel chegou até a responder em um anuncio de rádio. Uma loja havia colocado no ar a propaganda “Não compre roupa feita, compre roupa bem feita”. E Daniel, com sua perspicaz criatividade para frases bonitas, colocou uma propaganda no rádio que dizia: “Não compre roupa feita, roupa feita por mais bem feita, nunca é perfeita!”.

Criar slogans e anúncios é um dos talentos de Daniel. Anunciou em várias emissoras de rádio da cidade, durante muitos anos, e sempre escreveu os textos. Em um deles, inventou um personagem que não tinha o que usar. “Adão não se vestia porque Daniel não existia”. A frase virou marca do alfaiate e é lembrada até hoje por muitos moradores de Joinville.

Mas apesar da habilidade com as palavras, Daniel diz que a alfaiataria é seu verdadeiro dom. “A minha profissão depende de dom, tem que ter vocação”. E foi por isso que Daniel aprendeu seu ofício com facilidade e entusiasmo, mas, mesmo tendo habilidade suficiente, nunca deixou de estudar.

Daniel participou de muitos encontros e congressos de alfaiataria no Brasil inteiro e até em outros países. Fez cursos no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre. Participou de eventos em São Paulo, Montevidéu no Uruguai e na encantadora Santiago, no Chile. Em todos os lugares que passou, fez amigos e aperfeiçoou sua profissão.

Em uma de suas idas a Santos, conheceu a escola de alfaiate da Febem e trouxe para Joinville a ideia de ensinar alfaiataria aos presos. Infelizmente, o projeto não deu certo, mas outra sugestão foi acatada pelo então prefeito Luiz Henrique, hoje governador: a de criar um curso na rede municipal. Graças a Daniel, o curso foi criado e serviu para prolongar um pouco mais a profissão. O que Daniel lamenta é a quantidade mínima de pessoas que acabaram por se formar antes de o curso acabar por falta de procura.

Assim como o atual governador Luiz Henrique da Silveira, que lhe ajudou nos projetos quando prefeito, muitas outras personalidades foram vestidas pelo alfaiate. O governador Pedro Ivo Campos usou muitos ternos feitos pelas mãos de Daniel. O ex-prefeito de Joinville Marco Tebaldi também recorreu aos seus serviços e tomou posse vestindo um de seus elegantes trajes.

De cabeça erguida, com os olhos distantes e um leve sorriso no rosto, Daniel se enche de orgulho ao contar seus feitos durante tantos anos de trabalho. E, apesar de ser conhecido no Brasil inteiro, o alfaiate da multidão também se sente orgulhoso por sua cidade. “Daniel da Silveira, até morrer, nascido e criado em Joinville, sem vontade de sair” – brinca ele.

Com tantas histórias e lembranças, o alfaiate da multidão permanece junto a seus tecidos na nova loja que hoje é também sua casa. O orgulho pelo seu trabalho e a dedicação são seus companheiros em dias que se distanciam daqueles que o fizeram ficar conhecido em Joinville e no resto do Brasil como Daniel, o alfaiate da multidão.

As propagandas de Daniel

Adão não se vestia
Porque Daniel não existia
Agora se veste, Adão
Tem Daniel, o alfaiate da multidão

Cada roupa tem seu tempo
Cada tempo uma estação
Uma roupa para qualquer tempo
Só no alfaiate da multidão

Não compre roupa feita
Roupa feita por mais bem feita, nunca é perfeita

O símbolo de elegância e perfeição
É Daniel, o alfaiate da multidão

3 comentários:

Unknown disse...

UM excelente profissional e tenho muito orgulho de meu pai Aldo João DA Silva ter pertencido a equipe de Daniel Alfaiate.

Unknown disse...

Também seria injustiça deixar de mencionar a parceria que teve com o Sr. Minatti. Aos três, só elogios. Minatti, Daniel e Aldo, os melhores alfaiate que Joinville teve.

Unknown disse...

Este homem foi um vitorioso,
só eu sei o quanto é perdurar por tanto
tempo em Alta Costura.



Abraços Alfaiate da Multidão!!!
Você merece Aplausos!

Escola de Alta Costura CARLIS
CAMPO MOURÃO PARANÁ.